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Sobre nossos primeiros sonhos

Estou aqui para falar com você, que ama a dança, que vive com ela o máximo que pode, mas acordou em 2017 sabendo que esse será um ano de escolhas difíceis e sacrifícios.  Dizem que a melhor época da vida é a infância, e como é possível não concordar? Muitos de nós vestimos nossa primeira sapatilha ainda nos encantos da infância e/ou adolescência, quando a maior preocupação era fazer a lição de casa e talvez escapar de um ou outro castigo dos nossos pais (que lá no fundo sabemos, era merecido, né?).

As tardes livres eram preenchidas com pliés e só a aula de ballet não era suficiente para acabar com nossa energia: também tinha a aula de jazz e por que não experimentar um pouquinho de contemporâneo, afinal, a maioria dos seus amigos também estava naquela turma. E aí começam as aulas de pas de deux, de repertório, as aulas teóricas e o seu mundo é dança. Você respirava isso e amava poder passar a maior parte do tempo perto da barra e sonhando com seus futuros dias de glória nos palcos mais importantes do mundo executando com toda a perfeição possível os tão desejados 32 fouettes.

Os nossos sonhos eram tão reais. Talvez você, assim como eu, jurou se comprometer com a dança. E não haveria nenhuma festa de família, amigos ou namoricos que afastasse você disso – o ballet sempre viria primeiro. Quando se passa uns anos perdendo encontros e festas por conta de ensaios extras, isso acabando se tornando normal e você vai encaixando esses eventos num espacinho ou outro que tem. Mas em algum momento no meio desse caminho, a gente se deu conta de que era preciso um pouco mais de esforço para manter esse compromisso. Está na hora de entrar na faculdade, de encontrar um bom emprego, e que carreira eu devo escolher?

A pureza e a inocência que vivíamos a tão pouco tempo atrás de repente parece que pertenciam até a um outro “eu”. Os nossos sonhos eram tão reais. Mas como lidar com a exigência de se ter uma vida adulta, como se sustentar sozinho, como encarar a rotina de acordar cedo, enfrentar transporte público horas a fio, passar o dia desejando um lanchinho rápido, ir dormir só no dia seguinte? E talvez você escolheu amar a dança mesmo assim, sacrificando seus finais de semana, seus mais preciosos minutos de descanso, que hoje são tão raros.

Em 2017 pode ser que a gente não faça todas as aulas que gostaríamos. Muito provavelmente você não conseguirá passar as tardes de uma semana inteira cuidando do seu corpo, exigindo de você a correção dos detalhes mais minuciosos possíveis, mas vai ficar feliz de poder caprichar no coque, vai ficar feliz de poder ouvir o som das notas de um piano enquanto se deita sobre seu cansaço e mesmo assim consegue acertar a sequência dos tendus. Vai ficar feliz de saber que mesmo com todas os desvios que você se viu obrigado a fazer no seu caminho, continuou insistindo naquilo que te faz mais feliz.

E daí, num piscar de olhos você se lembra do momento onde tudo começou. Os nossos sonhos eram tão reais…